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mini-saia

O blog de Mónica Lice.

02
Fev16

10 anos de mini-saia

Mónica Lice

Cheguei a Bissau num misto de expetativa e receio. Movia-me o gostinho pela aventura - o mesmo que me fez sair do meu Raminho, do meu canto com vista para o mar, dos meus "ventos encanados" e eterno nevoeiro de inverno, para ir para a Faculdade de Direito, a Clássica, em Lisboa, para tirar o meu curso, ser advogada ou, quem sabe um dia, juíza.

 

A Faculdade fez-se com muito trabalho, muitas saudades de casa, muitos voos atribulados e muitas malas carregadas, com livros e quilos de comida, que vinha preparada e pronta para matar saudades do paladar da terra e da mãe.

 

Terminei com boas notas - as mesmas que me iriam garantir a entrada numa boa e grande sociedade de advogados, onde provavelmente trabalharia horas extra e, no final, ganharia, se ganhasse, um dinheirinho que ajudaria a pagar o quarto, no apartamento que partilhava com várias raparigas, entretanto feitas amigas, todas dos Açores.

 

Mas a vida prega-nos partidas - e talvez tenha sido Deus a trocar-me as voltas e a decidir que, no final da Faculdade, e depois das mil e quinhentas entrevistas que fiz, não tivesse a "sorte" de entrar em lado nenhum, porque o 15 de média final afinal não tinha tanto peso quanto uma boa cunha.

 

Foi também nessa altura que tomei conhecimento de um concurso para dar aulas em África, promovido pela minha Faculdade. Mas só tive conhecimento dele quase no final do prazo e foi preciso correr, literalmente, para ter o curso terminado a tempo, o diploma na mão e tudo certo para que a minha candidatura fosse aceite - o que acabou por acontecer.

 

Mas, em setembro, nem Guiné nem sociedades ou escritórios de advocacia...

 

E, minhas amigas, não foi nada fácil perceber que o trabalho de cinco anos afinal não era assim tão importante como um sobrenome sonante ou os conhecimentos com X ou Y. Eu não os tinha e, talvez por isso, só tenha conseguido um estágio não remunerado algum tempo depois, não nas Sociedades que almejava, mas num escritório bem mais pequeno, onde aprendi bastante e fiz amigas que ainda hoje guardo no coração.

 

Meses mais tarde, entrei, aí sim, numa Sociedade. Na entrevista, fiz questão de dizer ao advogado que me questionou tudo o que pensava sobre cunhas. A verdade é que entrei. E trabalhei durante um mês, sem nada receber, com a promessa de começar a ganhar 6 meses depois, um montante que nem me atrevo a postar aqui...

 

Após esse mês, numa quinta-feira santa, véspera da Páscoa, recebi a chamada que me mudou a vida, do Professor Januário Gomes. Ainda me lembro quando vi a sua chamada não atendida e, num segundo, percebi qual a causa e como, em poucos dias, a  minha vida poderia mudar, para sempre... 

 

Depois de falar com ele, percebi que estava certa. Tinha 3 dias para tomar a decisão - teria de lhe dar uma resposta no domingo e, se fosse positiva, embarcaria para a Guiné na sexta...

 

Na minha cabeça a resposta estava mais que tomada - mas, oficialmente, só o comuniquei no domingo. Escusado será dizer que, de segunda a quinta, tive os 4 dias mais alucinantes da minha vida, onde fiz de tudo: novo BI, novo passaporte, visto na Embaixada da Guiné, consulta de viajante, vacinas, um concerto do Michael Nyman (com a música de O Piano a servir de pano de fundo para a mudança) e empacotar parte de uma vida de 24 anos em duas malas...

 

Inicialmente ia só por três meses. A ver se a experiência corria bem, se me conseguia "aguentar" por lá, se gostava do trabalho e conseguia lidar com a distância. Lembro-me perfeitamente que, na noite que antecedeu a partida, mal dormi.

 

Tinha ganho convites para o concerto do Michael Nyman, para o Coliseu, a ter lugar na quinta antes da partida, e não queria, mesmo, perder o concerto. Lá fui, depois de uma despedida com amigas e saí a correr para o aeroporto, onde levantei uma mala com medicamentos que a minha mãe me enviou através de uma amiga (pronta a ser empacotada, para seguir, na manhã seguinte).

 

Acordei bem cedo, fechei o resto das coisas, despedi-me de uma amiga e colega de casa e apanhei um táxi. Lembro-me de me despedir, em silêncio, das ruas de Lisboa, entre lágrimas silenciosas, a caminho do aeroporto e do que me custou a despedida com a minha mãe, ao telefone (o que até pode parecer estranho, tendo em conta que tinha saído de casa aos 18 anos...). 

 

Poupo-vos a descrição do que foi viver na Guiné - mas posso-vos assegurar que os três meses foram, afinal, quase cinco anos e que saí de lá com tristeza, por deixar aquela que se tornou uma das minhas terras do coração e o meu amor (que ainda lá ficou, por mais um ano, a trabalhar)...

 

Foi em Bissau que percebi o porquê de ter tirado o curso de Direito, de ter conseguido a média final que consegui e que me permitiu dar aulas na Faculdade, de viver num dos países mais pobres do mundo e de, aí, ter descoberto o verdadeiro amor, junto daquele que é agora o meu marido e o pai da minha filha.

 

Foi também em Bissau que escrevi o primeiro post no mini-saia, e que, num misto de aventura e novidade, me lancei nesta aventura da escrita.

 

Hoje celebro 10 anos desde desse primeiro post. E tudo mudou desde o dia em que, na sala do meu T2 do Calaboca, em Bissau, o primeiro post foi publicado...

 

A vida mostrou-me que os caminhos estravam traçados noutra direção e que o Direito foi uma das ferramentas necessárias para tudo aquilo que consegui alcançar.

 

A quem me acompanha desse lado, o meu mais sincero OBRIGADA! Sem vós, nada disto faria sentido. Obrigada por estarem desse lado, por ajudarem o mini-saia a crescer e por me terem permitir dar o salto, rumo a esta aventura que é ser blogger e consultora de imagem.

 

(Desculpem o longo do texto, mas acho que não podia ser publicado noutro dia, que não este - o dia 2 do 2 de 2016...)

 

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